“Nunca
entendi muito de cosméticos, talvez algo comum para o meu gênero. Para Luara,
nada parecia ser tão necessário quanto seu cobiçado estojo de maquiagem.
Lembro-me dela entusiasmada com as peças de teatro na escola. O ensino médio
decorria naturalmente, a não ser pela correria das provas que já exigia uma
nota superior. Era preciso recuperar as
notas do bimestre passado, o 4° bimestre não perdoaria resultados vermelhos.
Ser popular, ter boa aparência, mostrar ótimos resultados, parecia ser expoente
entre os adolescentes de minha época.
A “festa das Artes”: O show de Luara
Na
sexta-feira o palco para a “Festa de Artes” estaria pronto e como comprovei
depois ficara lindo e exuberante. Luara não podia esperar algo menor, havia se
preparado muito, produziu com suas colegas de trabalho o melhor figurino. As
ouvi conversar outro dia, enquanto o professor de física esboçava suas fórmulas
“intrigantes” no quadro negro. Elas dançariam no teatro, o grupo de dança seria
composto por uma família fictícia, que vivia da arte da dança. Não ouvi maiores
detalhes, a conversa do grupo nos corredores da escola era sempre cheia de
muito suspense altivo e surpresa arrogante.
Aguardei
a sexta com certa ansiedade e percebi que a escola estava no mesmo clima, as apresentações
da festa angariavam muitos espectadores, seria na quadra de esportes da escola
no período noturno. Me vesti bem naquele dia e junto com alguns colegas de
classe, subi a avenida principal da cidade em direção a nossa escola. Ao chegar
confirmei as minhas expectativas. O palco fora montado com esplendor imenso,
luzes por toda a sua extensão, um ambiente próprio com sensação de sala de
cinema. Entre uma ou outra apresentação e premiações da escola, era chegado o
momento de encenar, o teatro da “festa das artes” começara.
Enquanto
as luzes coloridas jorravam sobre o palco, o grupo todo arrumado apareceu como
um relâmpago, recebidos em êxtase pelos aplausos da plateia de centenas de
pessoas. A dança começou. O enredo da história do teatro se compunha, por uma
família que ganhava a vida dançando pelo Brasil a fora. Os rostos das
personagens estavam totalmente coloridos. A maquiagem era muito linda, porém
carregada e se parecia com máscaras. Luara dançava como nunca antes, ao fundo
ouvíamos a banda tocar com sublimidade. A história seguira com as personagens
se confraternizando como uma família muito feliz, ao ver o resultado de seu
sucesso aparente, sua fama e seu esplendor.
O choro de Laura: o drama existencial
De
repente ouvi um gemido, pensei ser algum bebê na terceira fileira de cadeiras
no colo de sua mãe. Estava enganado. Em prantos agora agudos, ouvi Luara
chorar, e como constatei depois, essa reação não havia sido combinada de
maneira alguma. Em um continuado pranto, com lágrimas que manchavam e diluía
toda sua bela maquiagem em forma de máscara, Luara desceu do palco e saiu
correndo em direção aos corredores que dava para saída da escola. Todos se
assustaram naturalmente, o teatro fora encerrado em sua metade, as cortinas se
fecharam. Depois de algumas últimas
palavras, o diretor encerrou a festa meio sem graça. Vi algumas pessoas
correrem atrás da adolescente, eu mesmo tentei, mas não pude alcançá-la. A
noite ia terminando ou se “entristecendo”, enquanto as cortinas se fechavam, as
luzes se apagavam e nenhum palco fazia mais sentido.
Passados
dois dias da frustrada “Festa das artes”, ouvi noticiado a grosso modo, que
Luara era vítima de violência sexual doméstica a alguns anos, e já não pudera
sustentar mais aquela vida maquiada que levava. Os envolvidos foram ouvidos, a
família de Luara não era a do tipo que fora representada pelos alunos no palco.
Alguém fora punido; as marcas porém, jamais se apagariam.”
Tirando as “máscaras”: vivendo de verdade!
Vivemos
e existimos em ambientes diversos, nossa velha natureza prefigura um modo
peculiar de aparentar: “Use Máscaras!”. Todos usamos uma certa espessura de
máscara. SE usamos, está fora de questão. Ninguém, naturalmente, estará
totalmente exposto diante de todos, e muitas vezes nem diante de uma sequer
pessoa! Porque usamos essa maquiagem em nossos relacionamentos? Quais são os
nossos medos? Alguns desses medos foram postulados no livro “Jornal do
Discipulado”. Seu autor sugere que os principais medos da intimidade são: O
medo da rejeição, o medo de confidências violadas ou medo da manipulação. São
medos válidos no sentido de que coisas indesejáveis podem acontecer quando nos
tornamos vulneráveis. Mas elas não deveriam acontecer. O ambiente de comunidade
que estamos tentando construir caminha para SER uma família onde podemos
compartilhar sem medo.
Nos
tornamos mais sinceros, mais vencedores e triunfantes, quando conseguimos
praticar a “vulnerabilidade” com alguém ou “alguns” da comunidade de fé. Nancy
Beach argumenta que “uma comunidade
cristã genuína é aquela em que as pessoas podem ser vulneráveis. Como uma
reunião AA podemos dizer: Sou um pecador e tenho esses problemas e estas
feridas. É assim que construímos uma comunidade verdadeira em vez de fachadas
ou em vez de colocarmos uma máscara aos sábados e domingos e dizermos: Tudo vai
bem!”. Em um contexto de interdependência que somente essa comunidade de
Cristo pode nos proporcionar, convido você a orar e acreditar neste “mundo
possível”: Uma família compartilhando sem medo!
“Peço-te hoje Jesus, que meu coração seja
povoado pelo desejo de compartilhar a medida do possível, que eu seja agraciado
por um grupo ou alguém, que assim como Barnabé para Paulo, seja um instrumento
de escuta e restauração nas mãos do Senhor. Que nossa comunidade se torne dia
após dia uma família que compartilha seus fardos sem medo! Amém.”
No
Eterno,
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